Para Inspirar
Conversamos com a especialista em Psicologia Positiva, Adriana Drulla, para entender como a culpa e autocompaixão se dão na maternidade
11 de Fevereiro de 2021
Seres humanos são complexos por essência e diariamente lidam com as suas próprias contradições. Somos feitos de diversas camadas, também conhecidas como sentimentos, capazes de sentir raiva, culpa e empatia em um único dia, na mesma medida.
Além disso, somos feitos de traumas que podem ou não reverberar em como somos, nossa personalidade e nossas atitudes. Sentimos anseios, afetos , dúvidas, saudades , estresses , paixões e temos dificuldade em perdoar os outros e até a nós mesmos.
Sabendo disso, é de esperar que, a partir do momento em que viramos pais e temos de zelar por um outro indivíduo e educá-lo, todos os nossos sintomas e nossa bagagem virão juntos. E eventualmente errar é parte natural do processo - ou pelo menos, assim deveria ser a interpretação.
Para Adriana Drulla, mestre em Psicologia Positiva pela Universidade da Pensilvânia e pesquisadora focada em autocompaixão e terapia focada em compaixão, pais que se perdoam mais acabam tendo uma relação mais próxima com seus filhos, que por ter tido esse exemplo, sentem menos medo de errar também.
Para entender sobre autocompaixão e parentalidade, precisamos voltar um passo. Apesar de parecidas e muitas vezes relacionadas, a culpa e a vergonha não são o mesmo sentimento. “O contrário de autocompaixão não é culpa, mas sim a autocrítica excessiva, que leva a um sentimento de vergonha de mim mesmo, como se eu fosse menor do que o outro, a sensação de querer esconder o que eu fiz do mundo, ou me esconder, ela é punitivista” explica Adriana.
A culpa, por sua vez, pode ou não levar a essa autocrítica punitiva. “A culpa é aquilo que a gente sente quando sabemos que fizemos algo errado, mas a preocupação é mais externa do que interna. Dentro de mim, sei que errar é humano. Mas quero reparar meus erros por estar preocupada com outro”, diz.
Na maternidade, por exemplo, a culpa materna pode se dar quando, em uma situação de nervoso, uma mãe grita com seu filho. Ela se sentirá mal e estará preocupada com seu bem-estar de alguma forma, portanto, isso a leva a tomar alguma atitude de reparação - se redimindo, ou pedindo desculpas.
“Esse é um dos contextos onde a culpa é positiva, e ela é bem presente em relações próximas, porque pra eu sentir culpa, eu preciso antes sentir empatia, estar preocupada com o bem-estar do outro. Quanto mais o bem-estar do outro for importante pra mim, mas estarei atenta às minhas atitudes” explica a especialista.
É um movimento diferente da vergonha que mencionamos anteriormente pois, nesse caso, a mãe se sente mal consigo mesma e pode se preocupar até com o que as outras pessoas vão pensar dela, se a criança irá contar o ocorrido para alguém, resultando em um foco somente nela, não atenta ao que o outro sentiu ou está sentindo.
Quando falamos de culpa e de parentalidade, é fato que ela recai mais sobre a mãe. Isso não é uma mera percepção, mas sim um padrão identificado até mesmo por especialistas como a Adriana. Para ela, isso ocorre porque existe uma ideia arraigada no inconsciente coletivo de que a mãe é a principal responsável e cuidadora daquela criança, e o que ela se tornará será um reflexo da conduta materna.
“Se formos entrar na literatura da parentalidade, é claro que não existem mães perfeitas, mas essa ideia da mãe que está sempre disponível, que nunca perde a razão, que não precisa de outras coisas além da maternidade, que nunca delega e que tá sempre sorrindo: todos esses ideais são vendidos para a mulher, que passa a ansiar por isso e, inevitavelmente, se sente inadequada e insuficiente a todo o tempo. E isso já não é mais sobre culpa, e sim, sobre vergonha. Pois trata-se dela, não do outro”, diz Adriana.
A atitude pós-confronto é mais importante do que o conforto na maioria das vezes. Uma vez separada a culpa da vergonha, é quando entramos com a compaixão e a autocompaixão. “Se sensibilizar com o sofrimento alheio e ter um desejo de aliviá-lo é a compaixão, ou com o seu próprio sofrimento no caso da autocompaixão. É ter essa capacidade de sofrer junto e buscar soluções”, comenta a especialista.
Alguns pesquisadores definem a autocompaixão em 3 elementos:
Então, como aplicar isso no maternar? “A autocompaixão depende de um sistema neuro afetivo, que envolve nossa fisiologia, nosso cérebro, como se a gente precisasse amadurecê-lo para senti-lo. Esse sistema é o da calma, cuidado, é aquilo que nos faz sentir acolhidos, e isso precisa existir desde pequeno. Para que, por exemplo, se eu sou pequeno e estou passando por uma dificuldade, eu errei e sou acolhido em meu erro. Se meus cuidadores acolhem minha humanidade, erros e fraquezas, eu me torno um adulto auto compassivo."
Ter uma mãe que não erra nunca, para a especialista, não é positivo para a criança justamente porque nós nos comparamos, sobretudo às pessoas que admiramos. Nos comparar com alguém que é aparentemente perfeito, traz uma carga gigantesca a esse ser humano em formação.
“O erro não é ruim, o problema é não reconhecê-lo posteriormente. Depois de gritar com a criança porque derramou o suco no sofá, é importante tentar se reconectar com ela, ainda que no dia seguinte, reconhecendo que ter gritado foi errado, dizer que isso acontece com todo mundo. Quando a gente reconhece o erro, não só a gente repara o nosso relacionamento, mas também dá um modelo para essa criança agir quando ela mesmo errar”, diz.
Isso é positivo para os filhos, como dito anteriormente, e também para os pais, que lembram que também são seres imperfeitos. “Pais acharem que estão sempre certos e não podem errar nunca tem a ver com o ego, com uma expectativa de perfeição errada, porque a gente precisa ser modelo pros nossos filhos e eles não são perfeitos, só precisam se sentir amados e acolhidos” conclui Adriana.
Segundo a pesquisa de nossa entrevistada, mães auto compassivas não só são um exemplo para lidar com essas questões, mas seus filhos - em especial os adolescentes - confiam mais nelas, pois não sentem medo de serem julgados. Lembre-se de que culpa e vergonha são sentimentos diferentes, e que errar é mais do que humano, mas também necessário para a construção de moldes mais possíveis para seus filhos. E você, já se perdoou hoje?
Para Inspirar
Conheça o significado do termo e como ele se desdobra no nosso dia a dia, mesmo sem que a gente perceba
14 de Outubro de 2020
Se você já ouviu o quinto episódio da segunda temporada do Podcast Plenae - Histórias Para Refletir , então já conheceu a história do empresário Rodrigo Hübner Mendes. Nele, Rodrigo conta como sua tetraplegia mudou toda a sua vida - e não só a respeito de sua mobilidade.
De fato, Rodrigo pôde ressignificar e reconhecer o seu corpo como seu principal veículo de locomoção e detentor de sua essência - essa que mora dentro de nós e é imutável, independente do que aconteça com o nosso físico. Mas, mais do que isso, ele passou a olhar mais o mundo ao seu redor, e se deu conta de tantas pessoas que vivenciaram o mesmo trauma do que ele, mas com menos condições financeiras.
Para além desse lindo relato, o episódio de Rodrigo traz o tema da deficiência física ao nosso portal, assim como o fez Henry Zylberstajn na nossa primeira temporada Sabemos que existem diversas deficiências, de diferentes naturezas. Mas o que todos eles vivenciam em comum? O capacitismo.
Entendendo o conceitoCapacitismo é toda a discriminação, violência ou atitude preconceituosa contra a pessoa com deficiência e se expressa desde formas mais sutis até as mais gritantes, segundo definição dada pela psicóloga e palestrante Solyana Coelho ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
Apesar de o termo não constar na Constituição Federal Brasileira, há uma lei promulgada em 2015, no Estatuto da Pessoa com Deficiência, que prevê a igualdade de oportunidades e tratamento como um direito à pessoa com deficiência, que não deve ser vítima de nenhuma espécie de discriminação.
Para a lei, “Considera-se discriminação em razão da deficiência toda forma de distinção, restrição ou exclusão, por ação ou omissão, que tenha o propósito ou o efeito de prejudicar, impedir ou anular o reconhecimento ou o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais de pessoa com deficiência, incluindo a recusa de adaptações razoáveis e de fornecimento de tecnologias assistivas.”
O conceito, segundo a escritora Leandra Migotto para o portal AzMina , “está associado com a produção de poder e se relaciona com a temática do corpo por uma ideia de padrão corporal perfeita; também sugere um afastamento da capacidade e da aptidão dos seres humanos, em virtude da sua condição de deficiência.”
O Capacitismo é um dos muitos preconceitos que temos arraigados na sociedade e acabamos perpetuando mesmo sem perceber. Quem nunca ofereceu uma ajuda não solicitada à um deficiente, partindo-se do princípio que ele não conseguiria realizar aquela tarefa simples?
Ou usou termos do tipo “não temos braço para fazer isso”, como quem diz não ter condição para realizar determinada tarefa? Há até as manifestações de surpresa diante da mera existência de um deficiente físico, como observamos no cartum de Ricardo Ferraz.
Apesar de ingênuas e livre de más intenções, essas são atitudes capacitistas. A própria palavra deficiente, no dicionário da Língua Portuguesa, não possui cunho positivo, indica sempre uma falta, uma incapacidade. Percebe-se que o problema está na raiz e está em todos nós.
E está até mesmo ao nosso redor. Nossas cidades são capacitistas. Mas como, se elas não falam e, logo, não podem ser preconceituosas? Explicamos: elas foram feitas por pessoas que nunca se atentaram aos problemas que um deficiente pode enfrentar para se deslocar.
Ainda que a lei obrigue as “diferentes instâncias e instituições sociais, como o trabalho, o Estado, a escola, a famílias entre outros” a garantirem as condições necessárias para que uma pessoa com deficiência tenha direito a acessibilidade e ao desenvolvimento independente, nem sempre isso acontece.
Conhecido como o maior canal sobre deficiência do YouTube Brasil, o canal “Vai uma mãozinha aí?” é feito pela youtuber Mariana Torquato, que conta como é o seu cotidiano “sobrevivendo sem uma das mãos”, como define a própria.
Mais do que dicas de penteados e dicas mais leves, Mariana também aborda discussões importantes e intensas a respeito do assunto tratado nesta matéria. Capacitismo, aliás, foi tema de um dos seus primeiros vídeos do canal, que você confere clicando aqui .
Um de seus vídeos, “Coisas que os deficientes não aguentam mais ouvir” fez tanto sucesso que ela criou a parte dois, com mais dicas do que não fazer quando estiver na presença ou não de um deficiente. Elencamos aqui alguns de seus ensinamentos ditos no vídeo:
Essas são só algumas situações elencadas por Mariana, com base em uma entrevista feita pela mesma com dezenas de deficientes. Ela também gravou u
m vídeo dedicado especialmente à ditados populares capacitistas
, como dizer “João sem braço”, “em terra de cego, quem tem olho é Rei” ou ofender alguém dizendo que essa pessoa “está surda” ou “é um retardado”.
Agora que você já sabe como o capacitismo é presente no nosso cotidiano, mesmo sem que a gente perceba, que tal nos policiarmos para fazer do mundo um lugar cada dia melhor e mais inclusivo?
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