Para Inspirar

Você conhece sua árvore genealógica?

Os testes de ancestralidade caíram na popularidade e trazem informações reveladoras sobre nós e nossos antepassados

3 de Fevereiro de 2021


Dizer que estamos todos conectados pode parecer uma sentença um tanto quanto mística. De fato, há várias interpretações para essa mesma frase. Desde as mais complexas - como o fato de que o ferro que corre em nosso sangue é o mesmo presente nas estrelas - até as mais banais, como saber que conseguimos atravessar o mundo em menos de 24h graças aos aviões. Ser parte de um todo é inclusive o que pregam religiões como o Panteísmo , por exemplo.

Mas estamos ainda mais conectados graças a um termo muito presente na educação básica, que todos já ouvimos um dia: miscigenação. Com todos os êxodos e migrações que a espécie humana já enfrentou, era de se esperar que nossa árvore genealógica mais longínqua fosse diversa e motivo de fascínio.

Fascínio pois, conhecer um pouco mais sobre seu passado é conhecer um pouco mais sobre você, e não só cientificamente falando. Saber, por exemplo, que seus antepassados pertenciam a um local majoritariamente populado por indígenas, é saber que você também faz parte da história mais remota do nosso país.

Em termos de saúde, é possível saber propensões a determinadas doenças e até se aprofundar na psicogenealogia, disciplina que existe há mais de 40 anos e estuda como nossas emoções podem ser afetadas por nossa árvore genealógica. É por meio dela que podemos investigar se o distúrbio alimentar do sujeito pode estar relacionado a uma privação (ou abundância) alimentar num passado. Ou se sua ansiedade crônica pode ter a ver com alta exposição a riscos. Etc.

O caminho das pedras

Mas como obter o meu próprio sequenciamento genético de ancestralidade? Se essa pergunta tivesse sido feita há alguns anos, a resposta seria muito diferente. Isso porque o teste de ancestralidade, como é popularmente conhecido, era inacessível tanto em termos de preço quanto em termos de logística.

A maioria deles era realizado em laboratórios internacionais, ainda que intermediados por laboratórios nacionais. Além disso, sua precisão era mais baixa do que a atual, pois para que o sequenciamento seja realizado, o mecanismo se baseia em cruzamento de informações.

Ou seja, é preciso ter um banco de dados bem alimentado, quanto mais informações genéticas de outros sujeitos, melhor. Uma vez coletado, quem analisará a sua amostra de DNA - que pode ser uma quantia pequena de saliva, por exemplo - será a inteligência artificial, ou seja, robôs e programas computadorizados.

O trabalho dessa etapa é identificar semelhanças genéticas entre suas informações e a de outros, em termos gerais. Há, claro, pormenores científicos envolvidos, mas basta saber que um computador irá cruzar os seus dados com de outras milhares de pessoas e encontrar o que pode ou não unir vocês.

Hoje em dia, o teste de ancestralidade se tornou mais popular por diversos motivos. O primeiro deles é o fator preço: com a produção feita agora internamente, em laboratórios nacionais, além de uma simplificação nesse processo de análise, acabou conseguindo baratear e popularizar o que era extremamente caro.

Há também um aumento de interesse genuíno em conhecer mais sobre quem somos, aprofundar-se em nossa essência de maneira 360. Algumas empresas inclusive já oferecem em dinâmicas aos seus funcionários que o teste seja feito, como contou a reportagem do portal Você S.A.

Isso resultou em um salto gigantesco para o segmento. Segundo a MIT Technology Review , já são mais de 26 milhões de pessoas com sua árvore genealógica mapeada nos últimos anos pelo mundo. Os dados, coletados em 2018/2019, já podem ter apresentado um aumento considerável.

O que precisa melhorar

Apesar do evidente crescimento, há ainda uma certa desconfiança quanto ao destino de dados tão sensíveis quanto nosso próprio DNA. No Brasil, há leis mais esclarecidas nesse aspecto, como a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, de número 13.709, que “proíbe o uso de informações genéticas para obtenção de vantagem financeira”.

É preciso nunca parar também de alimentar o banco de dados, para que os resultados sejam cada vez mais assertivos e abrangentes. Hoje, por exemplo, temos poucas amostras indígenas, o que dificulta na hora do cruzamento de dados para fins de identificação.

Também ainda não é possível afirmar se seus antepassados são por parte do seu pai ou de sua mãe, e é possível analisar até 8 gerações passadas, o que corresponde aos tataravós de seus bisavós. É bastante coisa, de fato, mas é preciso lembrar que o mundo é ainda mais antigo e que seria praticamente impossível chegar tão longe neste segmento.

Por fim, a questão das propensões a doenças específicas ainda gera um caloroso debate entre os especialistas. Primeiro porque não é uma ciência exata e, segundo Michel Naslavsky, professor do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva da USP, em entrevista à Revista Gama , “Quando você vende o risco para Alzheimer ou para doenças coronarianas, você está mostrando só a ponta do iceberg e aquilo não é muito informativo para a saúde. Isso não é melhor do que ler horóscopo no jornal de manhã: tem uma chance de ser verdade e uma chance de não ser.”

Para ele, a margem de erro ainda é bastante grande e incerta. “A maior parte das doenças, como diabetes, hipertensão, colesterol, tem uma arquitetura genética fatorial: a soma de uma combinação de mutações de efeito mais baixo determina esses riscos. Para mapear esse tipo de coisa você precisa ter 50, 100 mil pessoas nos bancos de dados. Ainda não temos isso para o Brasil e não é possível importar essas listas de outras populações”.

Portanto, a questão entre os cientistas se torna até mesmo ética: oferecer esse tipo de informação para a pessoa, que há grandes chances de não corresponder, mais ajuda ou atrapalha o sujeito que viverá na ansiedade de desenvolver as então comorbidades? É de se pensar.

Por ora, seguimos na poesia de ser e estar no mundo enquanto sujeito sozinho, mas sabendo que somos parte de um todo. A ânsia pelo autoconhecimento nunca é o bastante e deve estar sempre em constante evolução. Conheça os que vieram antes de você e então conheça um pouco mais sobre si mesmo. Você já se aprofundou em sua existência hoje?

Compartilhar:


Para Inspirar

"Na modernidade, você vale menos quando envelhece", diz Pondé

Em encontro realizado em São Paulo, filósofo refletiu sobre a contradição entre a longevidade e a desvalorização do velho na sociedade

3 de Outubro de 2019


O advento da longevidade, por si só, já deveria despertar um olhar sobre esse tema com reverência e cuidado, na opinião do filósofo Luiz Felipe Pondé. “Nós, como espécie, não estamos acostumados a envelhecer. Há mil anos, uma menina menstruava e já era o que a gente chama de adulta. Hoje a idade adulta chega lá pelos 35 anos”, afirmou ele no primeiro dos quatro encontros denominados Uma reflexão sobre o envelhecimento , realizado na plataforma de conhecimento M.inq , em São Paulo, em setembro. Confira alguns destaques de sua palestra. Conflito entre corpo jovem e velho Um dos temas mais contraditórios do envelhecimento é: na medida em que a gente vive mais, mais o envelhecimento é recusado como objeto psicológico, cultural e histórico. Se esse objeto é de recusa e negação, cria-se no seio da experiência humana contemporânea uma contradição quase insuperável, que chamo de o conflito entre a juventude e o envelhecimento do corpo. De um lado, você vai envelhecer. Do outro, tudo o que você não quer é envelhecer. Percebe a contradição? A modernidade nos leva a viver mais, por causa da medicina, mas ela mesma desvaloriza a longevidade. Isso é fato concreto. O idoso vai paulatinamente virando alguém que está ali, mas na verdade não está. O mecanismo de produção do mundo na experiência moderna pressupõe que você vale menos quando envelhece. Sei que tem um monte de marketing por aí que fala o contrário, mas é mentira. Você vale menos. Um dos argumentos possíveis para a diminuição do valor dos idosos é porque agora eles são maioria. Antes, era raro chegar aos 40 anos. Hoje, qualquer pessoa minimamente razoável consegue sobreviver. Medo de envelhecer A única forma de enfrentar o envelhecimento é através do amadurecimento. Parece óbvio, mas esse não é o tipo de investimento que a gente faz no sentido cultural. O que a gente tem feito é transformar a vida em uma espécie de evento em que você é eternamente jovem dentro dele. Não acho que a gente faça isso porque é um bando de idiotas, mas porque tem medo. O amadurecimento implica a assimilação dos aspectos sombrios do envelhecimento, como doença, morte e perda de pessoas. No entanto, vivemos em uma época em que a tendência a eliminar a integração dos aspectos sombrios é enorme, começando por dizer que eles não são sombrios. Essa negação me parece um ataque frontal a qualquer possibilidade de amadurecimento. Velhice como doença Há uma mudança de paradigma da ideia de envelhecimento, que é tirá-lo da chave de processo natural e colocá-lo na de patologia. É um tema científico, mas me pergunto se ele já não está instalado na nossa forma de ver o envelhecimento, ou seja, a ideia de que envelhecimento não é natural, nem uma fase da vida, mas uma doença que você não conseguiu evitar. Nessa ideia, o envelhecimento é algo indesejável, contra o qual se combaterá até o fim. O argumento de que o envelhecimento é doença coloca em xeque a ideia de encontrar sentido no envelhecimento. Qual é o sentido da vida humana? No sentido mais imediato da expressão, o sentido da vida humana é a morte. É por isso que muito filósofo já escreveu sobre o assunto, como Jean-Paul Sartre, em O Ser e o Nada , e Martin Heidegger, em Ser e Tempo . Tem um texto do filósofo alemão Walter Benjamin chamado A morte do narrador. No mundo moderno e contemporâneo, o narrador é compreendido como aquela pessoa que vivia várias épocas e gerações. No sentido filosófico, o narrador da vida é aquele que está no lugar de quem sabe mais. Mas essa ideia de que pessoa que vive mais sabe mais está sob forte ataque. Os mais velhos estão alienados de um processo que está acontecendo no mundo, onde quem sabe o que está acontecendo são os mais jovens. Envelhecer bem custa caro A longevidade é construída numa série de exames, tratamentos, alimentação, disciplina e busca de sentido. Existe uma dimensão material no envelhecimento, que faz com que pessoas com melhor condição financeira vivam mais e envelheçam com mais qualidade. Quanto mais pobre é, pior envelhece. Algumas pessoas resolvem lidar com o envelhecimento investindo nelas mesmas. Elas não têm filhos, ou têm poucos filhos. Para as mulheres, essa opção ainda evita a gravidez e os problemas físicos decorrentes dela. Avós em extinção A figura clássica da avó vai desaparecer, porque não necessariamente mulheres mais velhas quererão desempenhar esse papel. Aos 60 ou 70 anos, elas vão estar por aí querendo ser felizes. Querem viajar, conhecer pessoas, quem sabe ter mais experiências sexuais, não tomar conta do neto porque a filha resolveu trabalhar. Querer que sua mãe não tenha vida para cuidar do seu filho é, por si só, uma forma de exploração do outro. As avós que farão isso são aquelas que terão menos vida para elas mesmas.

Compartilhar:


Inscreva-se na nossa Newsletter!

Inscreva-se na nossa Newsletter!


Seu encontro marcado todo mês com muito bem-estar e qualidade de vida!

Grau Plenae

Para empresas
Utilizamos cookies com base em nossos interesses legítimos, para melhorar o desempenho do site, analisar como você interage com ele, personalizar o conteúdo que você recebe e medir a eficácia de nossos anúncios. Caso queira saber mais sobre os cookies que utilizamos, por favor acesse nossa Política de Privacidade.
Quero Saber Mais