Entrevista com

Morena Leite

Chef de cozinha

A relação entre a cozinha e o afeto

Entrevistamos a chef Morena Leite para entender como um ritual tão parte de nossos dias pode dizer tanto sobre nós mesmos

17 de Novembro de 2020



Aos 40 anos, Morena Leite acha a autodefinição uma tarefa complexa. Isso porque ela é muitas em uma só: mãe, esposa, filha, amiga e ainda uma empresária de sucesso. Chefe no renomado Capim Santo, Morena também comanda a cozinha do Santinho, assina o cardápio do Hotel Janeiro, faz a curadoria do Festival Fartura e ainda é presidente do Conselho Instituto Capim Santo, que leva escolas de gastronomia gratuitas para jovens desfavorecidos socioeconomicamente.


Para ela, falar sobre comida e sobre cozinhar é mais do que falar somente sobre nutrição ou questões fisiológicas que envolvem o nutrir. É falar também de cultura, de afeto, de vontades, de autonomia. Confira o #PlenaeEntrevista a seguir e ressignifique a sua relação com seu próprio alimentar.


Como sua história com a gastronomia começou?

Sou prova de que a relação entre comida e família é muito forte. Cresci numa cozinha e na minha vida eu entendi que a comida podia ser um veneno ou remédio. Cresci com uma mãe cozinheira muito dedicada ao trabalho, e a cozinha, no começo da vida, era algo que “roubava” ela de mim, eu travava essa disputava. A forma que encontrei de chamar atenção da minha mãe foi me afastando da comida, até que desenvolvi um distúrbio alimentar e entendi que o caminho era oposto: para me aproximar da minha mãe, eu tinha que me aproximar também da comida. Então fui estudar gastronomia. Aí que me conectei e transformei uma questão da minha vida. 


Ao longo da sua carreira, o que a cozinha te ensinou de mais valioso sobre relações e pessoas?

Eu acredito que nosso paladar e nossa personalidade caminham juntos. Pessoas mais fechadas para experimentar tendem a ter essa postura também em suas relações, assim como os compulsivos costumam ser ansiosos. Através da alimentação, a gente pode curar muitas coisas do nosso comportamento e da nossa personalidade. Acho que hoje, por falta de tempo - apesar da mudança que a pandemia também propôs - a gente perdeu o hábito de comer junto. As pessoas têm horários muito diferentes, acordam muito cedo, não se encontram. E esse momento de comer à mesa sempre foi um momento de transmissão de valores. Então acho muito importante essa comunhão, o momento de sentar à mesa e comer junto. A comida a gente não se nutre apenas fisiologicamente, mas também emocionalmente, afetivamente, culturalmente.


Quais são os benefícios de uma comida feita à 4 mãos, ou seja, trazer os filhos também para essa responsabilidade?

Cozinhar juntos traz uma questão de segurança e de solidez muito forte. Tenho observado famílias que têm tanto a questão da cultura e do status social, mas também uma questão de saúde: comer é para alguns uma questão de prazer, e para outros de saúde. Eu vejo o quanto os pais se envolvem na alimentação dos filhos nas escolas que trabalho e assino cardápios. Mas isso também tem que ser espontâneo, como tudo na vida. Não se pode forçar alguém a cozinhar se ela não tem afinidade. Até porque, tão importante quanto cozinhar junto, é comer junto, como eu mencionei anteriormente. Tem gente que não tem o hábito de ir lá e cortar e cozinhar, mas adora ir num restaurante, numa feira. Tem gente que não tem essa conexão. A relação com a comida é a primeira que a gente tem desde o primeiro dia de vida até o último. Então ter uma relação saudável, equilibrada e prazerosa e bem importante.


O que muda quando cozinhamos nossa própria comida?

Eu tenho visto uma geração mais nova de 13, 14 anos virando veganos. Isso já demonstra esse olhar mais atento à sua própria nutrição, ouço relatos até mesmo de pessoas que não saem mais para comer, só comem suas próprias comidas. É muito esse cuidado de saber se nutrir, saber se cuidar, ser autossuficiente e não ter um monte de gente te cuidando que a geração mais jovem já apresenta. Quando sabemos produzir aquilo que vai nos fazer bem, é muito benéfico. Porém, eu acredito sempre no equilíbrio, saber não ser tão rígido. Eu acho que é bom cozinhar a própria comida, mas também receber o carinho na comida de alguém, da sua mãe, vó. A comida também tem energia, ela vem com a energia de quem cozinhou e isso também é cuidar de si mesmo. Tudo tem que ter flexibilidade.


E qual é essa relação entre a cozinha e o autocuidado?

Antes de amar o próximo, temos que amar a nós mesmos. É como o avião, você tem que colocar a máscara em você para depois colocar no outro. E se alimentar direito é se cuidar e ter amor próprio. Acredito muito na frase: a gente é o que a gente come. Como disse, nossa personalidade reflete diretamente no nosso paladar. Ele é desenvolvido num primeiro momento no útero materno, com o que a mãe se alimenta na gravidez, depois na amamentação que ainda é a continuação desse laço afetivo com a criança. Num terceiro momento, tem muita relação ao lugar onde ele foi criado, ao seu país, sua cultura e até sua religião. E aí o quarto momento que é de escolhas, que é resquício de tudo isso que o indivíduo conheceu e viveu. A comida de repente não é só prazer, é uma fonte de energia, e aí você começa a se perguntar: isso vai me fazer bem, vai fazer bem para o planeta? Da onde vem essa comida? Você começa a ter toda essa responsabilidade nesse cadeia porque na realidade está também preocupado consigo mesmo.


Como uma pessoa que tem o dia a dia muito corrido pode se aproximar da cozinha de maneira mais afetiva?
Você pode cozinhar em um dia da semana, num domingo à noite, por exemplo. Eu deixo tudo em potinho preparado para minha filha e, no dia a dia, chego em dois minutos e só finalizo, faço os acompanhamentos. Eu penso num cardápio da semana, deixo ele pré-produzido. É uma forma de já até prever a minha semana. Você compra um peixe e já porciona ele, você já cozinha a batata doce e deixa congelada. Tudo em potinhos. E o momento da refeição, não importa se vai demorar 10 minutos ou 1 hora, contato que você esteja presente nele, encaixado no contexto da sua vida. Pode ser até uma refeição mais rápida, mas praticar o ritual de se alimentar e de se nutrir plenamente, sem celular ou afins, é muito importante.

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#PlenaeApresenta: Wanessa e a coragem de enfrentar a si mesmo

O Plenae Apresenta a história da cantora Wanessa, participante da nona temporada do Podcast Plenae!

5 de Setembro de 2022



Respiração e batimentos acelerados, mãos suadas, sensação iminente de perigo, agitação. Esses são alguns sintomas de quem sofre de ansiedade, e que em sua pior versão, pode evoluir para uma Síndrome do Pânico. É a realidade da cantora Wanessa, que lida com esse transtorno mental desde os 20 anos de idade e que, recentemente, resolveu tratar a questão de forma não-medicamentosa.

Representando o pilar Mente na nona temporada do Podcast Plenae, a artista reconheceu que o seu principal gatilho é justamente o medo da morte. Isso se deve, provavelmente, ao fato de que durante a infância, ela esteve frente a frente com a finitude de múltiplas formas.

“Com seis meses de vida, eu sofri com uma pneumonia grave e fui parar na UTI. Com 1 ano de idade, eu abracei um ferro quente e precisei fazer uma raspagem por causa de uma queimadura de quinto grau. Aos 3 anos, eu engoli um parafuso de uns 3 centímetros. (...) Com 6 anos, eu fui atropelada e desmaiei, mas permaneci consciente. Eu lembro de estar sozinha num lugar escuro, pensando: ‘Eu morri? O que aconteceu comigo? Por que eu não consigo acordar?’”, relembra. 

Sua primeira crise foi já jovem adulta, durante um jantar com amigas onde nada parecia justificar a sensação de morte iminente. Acontece que, quando se trata de um transtorno mental, não existe algo “do nada”, mas sim a junção de pontos que foram ignorados ao longo do tempo. 

Nessa época, ela buscou ajuda de médicos e de remédios, caminho comum para quem lida com um transtorno desse tipo. Após um tempo de tratamento, ela decidiu parar a medicação e, por muito tempo, ficou bem. Foi quando a pandemia chegou e, com ela, novas crises, nascidas de novos receios. 

“Bem no começo da pandemia, eu peguei covid e, um mês depois, comecei a sentir um cansaço extremo. O meu corpo não esquentava, eu tremia e tinha confusão mental. Fiquei muito estressada, até descobrir que eu estava com hipotireoidismo. Esse diagnóstico aumentou a minha ansiedade, que já estava alta desde o começo da quarentena, com aquele caos no mundo”, diz.

Além de sua própria experiência com a covid, ela também enfrentou perdas como a do avô e a do empresário. Novamente, a morte entrou em curso. Em um certo momento, ela passou a ter crises de pânico diariamente, até mesmo em momentos críticos, como no volante, enquanto dirigia. Nesse momento, ela procurou psicólogos e psiquiatras e voltou para a medicação, mas a questão parecia só piorar.

“Sugeri para os meus médicos: ‘Vamos juntos tentar sem medicação?’. Eu sei muito bem que, com o remédio alopático, eu ia melhorar em questão de dois meses. Eu ia me sentir confortável, me distrair e parar de olhar para mim mesma. Ia relaxar e largar o processo terapêutico, igual da outra vez. (...) Eu só tinha varrido a sujeira para baixo do tapete. Nesse reencontro com o pânico, eu não podia mais tapar o sol com a peneira. Eu decidi mergulhar profundamente em mim, para entender o que estava acontecendo comigo”, conta. 

A primeira parte do processo terapêutico foi apagar o incêndio, enxugar a inundação, limpar a casa e ver onde estavam as goteiras, como conta ela. Foi preciso identificar seus gatilhos de uma vez por todas para se manter alerta para os próximos momentos. 

"Hoje, quando eu percebo algum sinal de alarme no meu corpo, eu não espero mais chegar no lugar do descontrole para agir. Eu aprendi técnicas para navegar junto com a crise, até ela passar. Oração, respiração e meditação guiada para aplacar a ansiedade funcionam muito para mim. Eu também uso estratégias de afirmação para acalmar o meu lado racional. Eu repito para mim mesma: “Você já teve esse pânico 10 mil vezes. Você fez todos os exames. Não tem nada no seu coração. O seu pulmão tá limpinho etc.”. Vou escaneando o meu corpo, até entender que o sintoma é só um truque da minha mente mesmo”, conta.

Com a terapia, Wanessa também identificou a origem dos seus sofrimentos em um TOC nunca antes diagnosticado, seguido de uma hipocondria que gera o medo da morte iminente. Hoje, além das técnicas utilizadas mencionadas, ela também precisou admitir que não há uma bala de prata que vá solucionar tudo. Fazer as pazes com o fato de que crises ocorrerão e que você falhará de alguma forma é parte do tratamento. 

“Eu tenho buscado ser uma pessoa mais leve, menos crítica comigo mesma. Eu sempre me castiguei muito quando errava, porque tudo tinha que sair perfeito. E eu vi que não tem como eu ser, ao mesmo tempo, boa mãe, boa profissional, boa filha, boa amiga, boa para mim mesma… Não dá! Alguma coisa vai falhar”, pontua. 

Ela também passou a se importar menos com o exterior por estar olhando com mais atenção para o interior, mas pretende deixar como um de seus legados falar desse assunto sem tabu e, assim, ajudar outras pessoas que possam se sentir da mesma forma que ela e não conseguem explicar.

E você, estaria disposto a mergulhar tão profundamente dentro de si durante uma crise? Inspire-se na coragem de Wanessa e ouça seu episódio apertando o play aqui dessa tela, ou no seu streaming de música favorito!

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